sexta-feira, 25 de março de 2016

4085) Garcia Márquez na URSS (26.3.2016)





Winston Churchill disse certa vez que a URSS era “uma adivinhação embrulhada num mistério e guardada dentro de um enigma”. A URSS e a China foram as duas maiores megaexperiências sociais do século 20, numa escala ciclópica de autoritarismo, de frenesi industrializante, de exploração do trabalho, de condicionamento ideológico. Nós aqui do Ocidente podemos apenas imaginar pelos relatos (a favor e contra) que chegaram até nós. Vi neste saite (http://tinyurl.com/zkn78na) algumas impressões de Gabriel Garcia Márquez quando visitou o país dos sovietes, em 1957, e que retratam tanto o país quanto o olho humanista e esperto do jornalista e escritor.

Diz Gabo: “Parece que estamos viajando rumo a um horizonte inatingível num mundo bem peculiar, onde o tamanho de tudo excede as proporções humanas, e precisamos mudar toda a nossa percepção da normalidade para tentar entender este país. (...) O alfabeto russo tem um aspecto tal que as letras das placas parecem estar se desmanchando em pedaços, o que nos dá uma impressão de ruína. (...) Este é um povo que parece precisar desesperadamente de fazer amigos. (...)  Dá para entender a velha piada americana de que os soviéticos acham que inventaram tudo, desde o garfo até o telefone. Enquanto o mundo ocidental acelerava rumo ao progresso tecnológico, eles estavam aqui tendo que criar o básico. Se um turista em Moscou encontrar um sujeito nervoso que diz ter inventado o refrigerador, não pense que ele é maluco. É bem possível que ele tenha precisado inventar algo que já existia no Ocidente. (...) O povo russo não toma café, e encerra as refeições com chá. Eles tomam chá a qualquer hora. Os melhores hotéis de Moscou nos servem um chá chinês de tal qualidade poética, de um aroma tão sutil que a vontade que a gente tem é de derramá-lo na cabeça.
“Os soviéticos exprimem seus sentimentos da maneira mais exaltada. Demonstram sua felicidade como se estivessem dançando uma dança cossaca. Estão prontos a dar a alguém a única camisa que possuem, e quando se despedem de um amigo choram lágrimas verdadeiras. Mas tornam-se discretos e furtivos quando a conversa descamba para a política. (...)  Quem vê fotos das vitrines das lojas, todas vazias, tem dificuldade em crer que os soviéticos tenham armas nucleares. Mas a vitrine vazia confirma a veracidade desse fato. As armas nucleares, os foguetes espaciais, a agricultura mecanizada, as usinas elétricas e os esforços titânicos para transformar um deserto em terra cultivável têm como resultado o fato de que para isto o povo soviético tem usado sapatos ruins e roupas mal cosidas, e tem passado por grandes necessidades nos últimos 50 anos.”