sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

3989) Histórias que se passam numa noite (5.12.2015)




Não sei se nesses saites com glossários de figuras narrativas ou clichês da dramaturgia este subgrupo está registrado. Se não, registro eu: são as “Histórias Que Transcorrem ao Longo de Uma Única Noite”, numa narrativa que às vezes dá a sensação de que está acontecendo em tempo real. Sem ser o exemplo mais famoso (estes vêm abaixo), o que mais tipicamente de lembra esse gênero é The Night of the Jabberwock (1950) de Fredric Brown. É uma história de crimes praticados e investigados numa cidadezinha do interior, numa única noite. O romance dá a impressão de ter sido escrito ao longo de uma noite, e eu o li numa noite, entre o jantar e a hora em que fui dormir.

Colateral (2004), o filme com o pistoleiro Tom Cruise e o taxista Jamie Foxx, pertence ao gênero com louvor, pela narrativa tensa e bem encadeada. Não lembro se Fuga em Nova York (1981), com Kurt Russell, também transcorre numa noite única, mas é o que a lembrança me sugere. (Poderia ir consultar no Imdb, mas daria a impressão de saber tudo de cor, o que não vem ao caso.) Alguns filmes dão a impressão de acontecerem numa noite só porque acontecem em ambiente fechado com ação incessante; é o caso de Rocky Horror Picture Show (1975).

No romance policial, outro favorito meu é Deadline at Dawn (1944) de William Irish (pseudônimo de Cornell Woolrich). Um rapaz e uma moça se conhecem de noite. Apaixonam-se. Descobrem que odeiam a cidade grande. Decidem ir embora juntos dali, mas justo nesse instante se envolvem num crime. Têm até o amanhecer para descobrir o criminoso antes que a polícia os prenda.

Um ótimo livro de fantasia tenebrosa (dark fantasy) é After Dark (1980), de Manly Wade Wellman. É bem verdade que os primeiros capítulos têm outra cronologia, mas mais da metade do livro é a narrativa tensa de uma noite interminável passada por um grupo de pessoas numa casa, cercadas por entes sobrenaturais que tentam penetrar suas barreiras psíquicas, ansiosas para que o sol nasça e venha em seu socorro.

Histórias assim nos trazem um pouco aquele sensação vertiginosa e asfixiante de tempo real, que experimentamos em filmes como Matar ou Morrer (Fred Zinnemann), Cléo das 5 às 7 (Agnes Varda) e outros. A impressão de que tudo está acontecendo diante dos nossos olhos, de que não existem hiatos, pausas, saltos para a frente do tipo “Alguns dias depois...”. A aventura contada torna-se uma “longa jornada noite adentro”, como a jornada sofrida de Os Selvagens da Noite (“The Warriors”, 1979) tentando voltar para casa durante uma noite que parece que não tem mais fim, não tem mais fim, não tem mais fim.