sexta-feira, 2 de agosto de 2013

3254) Amarildo e Bruno (2.8.2013)






Amarildo de Souza é um pedreiro da Rocinha que no domingo 14 de julho, às 8 da manhã, foi levado de casa por policiais da UPP, para averiguação, e nunca mais foi visto. Na terça-feira dia 16 a família registrou o desaparecimento. Na imprensa, nas manifestações de rua, nas redes sociais, todo mundo ergue cartazes, posta mensagens e faz a pergunta: “Cadê o Amarildo?”. A polícia diz que Amarildo foi interrogado e liberado às 19:40 do domingo, mas as câmaras nas proximidades não registram sua saída; aliás, “as duas câmaras instaladas na frente da sede da UPP não funcionaram desde as 8h do domingo em que Amarildo desapareceu até o fim do dia.” Uma cômoda coincidência (ou incômoda, de acordo com o ponto de vista).

Já o caso de Bruno é diferente. Ele era um dos manifestantes que no dia 22 de julho protestavam na rua Pinheiro Machado, perto do Palácio do Governo. Preso pela polícia, foi acusado de estar portando uma mochila com mais de 20 coquetéis molotovs e de ter jogado um deles na tropa da PM. Bastaram dois ou três dias para que surgissem nas redes sociais dezenas de fotos e vídeos argumentando, com riqueza de detalhes, que: 1) Bruno não estava de mochila; 2) no arremesso do primeiro coquetel molotov ele estava bem visível na linha de frente dos manifestantes, e a bomba veio de trás; 3) que dois indivíduos, um deles com roupa semelhante à do que foi filmado jogando o coquetel (visto em outra imagem) saem da manifestação, correm para o meio da PM, são barrados, identificam-se aos gritos e em seguida os PMs permitem que os dois entrem no grupo e se refugiem na retaguarda. A tese de que os dois são P2 (policiais disfarçados, infiltrados para ações de provocação) levou a justiça a liberar Bruno, pela análise das imagens.

Dois episódios que mostram para onde o mundo está indo, mesmo que a gente não goste: para a “sociedade transparente” que David Brin avistava em 1998 (ver: http://bit.ly/152RX7J ), a cidade onde os espaços públicos estão vigiados por câmeras, gravando imagens que podem ser usadas para reconstituir as ações de qualquer pessoa.

Isso é bom? É ruim? Nenhuma tecnologia é boa ou ruim em princípio, o que conta é o modo como é usada. Estes dois casos mostram situações opostas. No caso de Bruno, o enorme número de câmeras ajudou a desmascarar uma acusação falsa e liberar um inocente. No caso de Amarildo, a inexistência de câmeras funcionando nos impede de saber se, quando e em que condições ele saiu das dependências da polícia. Só temos um caminho: aprender a conviver com a vigilância e a transparência, usá-las para o bem individual e coletivo, porque a opção de viver sem elas não existe mais.