terça-feira, 25 de dezembro de 2012

3065) Natal 2012 (25.12.2012)




(Catryn Arno)


...e estou de volta ao ponto de partida, 
ao trampolim do Tempo que me impele 
a saltar para fora desta pele 
como quem larga a roupa no banheiro. 
Meu último dezembro? Ou o primeiro 
noutro plano que não este de agora? 
É noite. Ruge o trânsito lá fora 
nessa avenida insone que não para 
e as multidões arquejam no Saara 
buscando o oásis do crédito fácil. 

E onde diabos perdi o meu palácio? 
Em que bolso esqueci o meu castelo? 
Quede o meu submarino, aquele yellow, 
que cruzava universos transversais? 
As alucinações sensoriais 
transportaram meu corpo a outro porto 
onde um dia, não sei, voltarei morto 
e encontrarei meu rosto adormecido 
num travesseiro feito do tecido 
que as aranhas bordaram para mim. 

Someone tells me that life is but a dream 
e a guilhotina do despertador 
decepa o sono no melhor do amor 
e me projeta nesta Distopia 
em que mais queima e dói a luz do dia, 
o ferro-em-brasa de qualquer verão, 
do que a treva, a ausência, o nada, o não, 
o Nirvana do zero absoluto... 
Bastam só as besteiras que eu escuto 
pra sonhar em viver como um Beethoven 

pois os surdos não sofrem do que ouvem 
como nós, a nadar no som alheio, 
um rumor que jamais diz a que veio 
mas aumenta o volume e abaixa o nível. 
Bora lá, paladinos do impossível, 
combater o mau gosto, o gosto médio! 
Quero afogar em vodka este tédio, 
sufocar o Medíocre em si mesmo, 
essa tela que berra à balda, a esmo, 
como se fossem gralhas coloridas. 

Este ano custou-me tantas vidas... 
mas eis-me aqui ao fim de tudo, intacto, 
intratável e áspero; o cacto 
de Bandeira, que morre e não se entrega. 
E em dezembro retorna a luta cega 
das comemorações obrigatórias, 
mil cervejas, mil risos, mil histórias, 
tudo festivo como um Facebook 
onde cada usuário emprega um truque 
pra divulgar o seu melhor retrato. 

Nessa luta de cão-e-gato-e-rato 
não dá pra dispensar a hipocrisia, 
que não deixa de ser diplomacia, 
revestida de boas intenções. 
Sendo assim... tragam logo esses garçons, 
o champanhe, a cerveja, os canapés... 
Que seja a vida como os cabarés 
ou a buate que eu chamava “bôite”, 
onde a festa feliz virava a noite 
e o álcool desmanchava o sofrimento. 

Este ano passou feito um momento: 
vupt! – e pronto, é Natal mais uma vez. 
É hora de lembrar o que se fez, 
empurrar o não-feito mais pra frente, 
abraçar, receber e dar presente, 
como a peça mil vezes encenada 
que toda noite vem modificada 
pela corrente oculta dos Acasos 
visto que o Tempo não tolera atrasos 
e que nossa viagem é só de ida...