quinta-feira, 8 de novembro de 2012

3025) Tradução: Paulo Bezerra (8.11.2012)






O paraibano Paulo Bezerra tem sido há bastante tempo um dos melhores tradutores do russo no Brasil, juntamente com o veterano Boris Schnaiderman e jovens como Rubens Figueiredo (“jovem” pra mim é quem é um pouquinho mais novo do que eu). Dias atrás ele recebeu a Medalha Púchkin, condecoração conferida a quem difunde a cultura russa em outros países, e que o próprio Schnaiderman já recebera. Bezerra, que mora hoje no Rio de Janeiro, não pôde ir a Moscou, por motivos de saúde.

Aos 72 anos, ele é um desses paraibanos de trajetória improvável. Nascido em Pedra Lavrada, aos 18 anos foi para São Paulo, tornou-se operário metalúrgico, entrou para o Partido Comunista, foi estudar em Moscou e estava por lá quando houve o golpe de 1964. Achou melhor demorar-se na URSS e esperar um momento mais tranquilo para retornar.  Enquanto isto, formou-se em História e Filologia, e voltou ao Brasil apenas em 1971. Em Moscou, já realizara suas primeiras traduções (como se sabe, os soviéticos traduziam e editavam em seu próprio país, em tudo quanto era língua, os clássicos do marxismo e da literatura local.)

Numa matéria de Joselia Aguiar da Gazeta Russa (http://bit.ly/Sh2eFb), Bezerra afirma que “aprendeu que o sentido muitas vezes está no ritmo”, e que ao traduzir busca “o ritmo das falas, da oralidade”. Suas traduções de Dostoiévski (para a Editora 34) surpreendem às vezes os leitores antigos, acostumados às traduções brasileiras feitas a partir de traduções francesas. Para esses leitores, a prosa elegante a que estavam acostumados é substituída pelo que Bezerra considera o verdadeiro Dostoiévski, de linguagem “dura e tosca”, e com momentos “de quase intradutibilidade”.

É mais ou menos como se alguém pegasse uma tradução de Graciliano Ramos para o inglês e a usasse para fazer uma versão para outro idioma, sem ter experimentado a prosa “dura e tosca” do original, e sem perceber, portanto, o quando essa dureza gerava dentro de si um novo sentido de elegância verbal, baseada num jeito cru de dizer as coisas sem floreios, em justaposições inesperadas, em sínteses brutais. A façanha de Paulo Bezerra nos traz um novo Dostoiévski, assim como as três versões que temos agora do Ulisses de Joyce nos permitem entrever melhor, nessa prosa triplamente refratada, algo da sonoridade e das significações do original.

Sobre o ato de traduzir, Paulo Bezerra diz: “É maravilhoso e exaustivo, entra-se numa espécie de estado encantatório, hipnose que o faz perder a noção do tempo. Quanto mais trabalha, mais se entrega ao trabalho. O texto arrasta você para dentro, surge uma segunda alma.” Acho que Dostoiévski não descreveria melhor.