quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

2446) O bandido João Branco (6.1.2011)



(Roy Barcroft, ou, no Nordeste, "João Branco")

Eu confesso que não tenho lembranças dele, mas muitos amigos meus recordam que Roy Barcroft era o indefectível vilão em mil faroestes em preto-e-branco das décadas de 1940 e 1950. Durão, mal-encarado, com voz intimidante, (apesar de na vida real ser, ao que se diz, um sujeito afável e brincalhão), Barcroft era o eterno fora-da-lei dando trabalho a mocinhos como Wild Bill Elliott ou Rocky Lane.

Ora, aqui no Nordeste surgiu, não se sabe como, a mania de dar aos personagens genéricos de Barcroft o nome de “João Branco”. Garotos de muitas cidades nordestinas sempre se referiam desse modo a ele quando contavam uns para os outros o filme que tinham visto na matinê da véspera: “Aí o artista entrou na caverna e quando viu apareceu João Branco com mais uns cinco bandidos, aí teve a maior briga, eles amarraram o artista em cima da linha do trem...”

Por que João Branco? Segundo Homero Fonseca, autor do romance “Roliúde” (a história do matuto que vive de contar filmes de Hollywood de cidade em cidade), os garotos de sua geração misturaram a figura de Roy Barcroft com o nome do autor das legendas em português dos filmes da época. E de fato eu me lembro que a maior parte dos filmes que eu via quando garoto se encerravam, na hora do “The End”, com uma derradeira legenda dizendo: “Legendas de João Branco”. (Anos depois, esta referência seria substituída por: “Tradução: S. da Rocha Spiegel”. Hoje, na TV a cabo, aparece: “Tradução: Drei Marc”). Por caminhos ínvios, o nome do tradutor foi associado, na imaginação dos pirralhos, à imagem do bandido.

Homero está tentando localizar quem foi de fato João Branco, que se ainda for vivo deve ter mais de 90 anos; e em que cidades essa relação entre seu nome e a figura de Roy Barcroft se estabeleceu. Isto é uma pesquisa curiosa porque o imaginário do faroeste norte-americano influenciou muitas gerações de garotos, desde os fãs de “Apolônio Cassíde” até os de Clint Eastwood.

Há pelo menos mais duas histórias curiosas misturando Nordeste e Faroeste. Não sei se muita gente fora dos limites de Campina Grande sabe que um dos grandes goleiros da Paraíba na década de 1950 foi o famoso Arricarêi, do Treze, e que este foi assim batizado por sua semelhança com Harry Carey, o grande ator de westerns dos anos 1920 e 1930. Um dos companheiros de infância e de peladas de Arricarêi era um neguinho chamado Zé Gomes, que, assim como o amigo, adotou para si um nome de cowboy, Jack Perry. Com o passar do tempo acabou ficando conhecido apenas como Jack, e depois que se tornou músico um diretor de rádio o batizou em definitivo como Jackson, e mais que isto: Jackson do Pandeiro.

Que pena não podermos perguntar a Arricarêi e a Jackson se eles alcançaram essa época em que o bandido era chamado de João Branco independentemente de seu nome em inglês. Seria um capítulo a mais na história do roliudismo que impregnou sucessivas gerações de garotos no brejo, sertão, cariri e agreste.